*
Vinhas escarlates, em Arles - 1888, VAN GOHG
ODE AO OUTONO
1
Estação de neblinas, doce e fecunda!
Companheira íntima do sol, com ele vais,
Quando ele abençoa e inunda
De frutos as videiras junto dos beirais;
Pra vergar de maçãs a musgosa macieira
E a fruta por inteiro tornar madura
Pra inchar as cabaças, prà avelã ficar gorda
Com uma doce amêndoa; há flores com fartura
Pra que a abelha as tenha sempre que queira
E pense haver dias quentes a vida inteira,
Pois o verão seus favos pegajosos transborda .
2
Quem não te viu já de fartura rodeada?
Às vezes, quem te procura sob outros céus,
No chão dum celeiro encontra-te descuidada,
O vento da limpeza ergue-te os cabelos.
Ou num rego meio-ceifado, em fundo torpor,
Tonta do perfume das papoulas, parada
A foice, junto da ceara a ceifar te demoras;
Às vezes, tens direita, qual rebuscador1,
A pesada cabeça, ao passar a ribeira;
Ou, junto de a prensa, observas tranquila
A cidra a gotejar no fluir das horas.
3
Que é das canções da Primavera? Onde hão-de estar?
Esquece-as, tua música também tem valor –
Nuvens orlam o dia morrendo devagar
Tingem os restolhos de sua rósea cor;
De os mosquitos a dorida serrazina,
Crescente, entre os salgueiros do rio se ouvia,
Diminuindo, se o vento fica mais brando;
Os cordeiros balem na próxima colina;
Cantam grilos, alto, mas cheios de harmonia,
Num quintal, pisco vermelho assobia,
E as andorinhas chilreiam nos céus em bando.
John Keats (1795-1821)
Trad. António Simões, in «Antologia de Poesia Anglo-Americana», Campo das Letras, Outubro de 2002
2 comentários:
Fernanda, procurei Outono e vim
à estrela da madrugada...
Fiquei encantada, com a pintura de Van Gohg e a belíssima poesia d John Keats.
Voltarei aqui, com certeza.
Um abraço
Lúcia
Lúcia, ainda bem que o destino a trouxe até aqui. Não sou muito assídua na publicação, mas ficarei sempre satisfeita com a sua visita.
Já a visitei, de corrida, e gostei da alegria que perpassa pelo sítio. Lá irei mais vezes e com mais vagar.
Um abraço e obrigada.
Enviar um comentário