Perdido
só eu de longe assisto
vem Inverno
ODE AO OUTONO
1
Estação de neblinas, doce e fecunda!
Companheira íntima do sol, com ele vais,
Quando ele abençoa e inunda
De frutos as videiras junto dos beirais;
Pra vergar de maçãs a musgosa macieira
E a fruta por inteiro tornar madura
Pra inchar as cabaças, prà avelã ficar gorda
Com uma doce amêndoa; há flores com fartura
Pra que a abelha as tenha sempre que queira
E pense haver dias quentes a vida inteira,
Pois o verão seus favos pegajosos transborda .
2
Quem não te viu já de fartura rodeada?
Às vezes, quem te procura sob outros céus,
No chão dum celeiro encontra-te descuidada,
O vento da limpeza ergue-te os cabelos.
Ou num rego meio-ceifado, em fundo torpor,
Tonta do perfume das papoulas, parada
A foice, junto da ceara a ceifar te demoras;
Às vezes, tens direita, qual rebuscador1,
A pesada cabeça, ao passar a ribeira;
Ou, junto de a prensa, observas tranquila
A cidra a gotejar no fluir das horas.
3
Que é das canções da Primavera? Onde hão-de estar?
Esquece-as, tua música também tem valor –
Nuvens orlam o dia morrendo devagar
Tingem os restolhos de sua rósea cor;
De os mosquitos a dorida serrazina,
Crescente, entre os salgueiros do rio se ouvia,
Diminuindo, se o vento fica mais brando;
Os cordeiros balem na próxima colina;
Cantam grilos, alto, mas cheios de harmonia,
Num quintal, pisco vermelho assobia,
E as andorinhas chilreiam nos céus em bando.
John Keats (1795-1821)
in «Antologia de Poesia Anglo-Americana – De Chaucer a Dylan Thomas », edição bilingue, pp. 239 e 241, Selecção, tradução, prefácio e notas de António Simões, edição “Campo das Letras”, Outubro de 2002.
fotos: fernanda s.m.
FIM DE SETEMBRO
Ó manhã, manhã,
manhã de setembro,
invade-me os olhos,
inunda-me a boca,
entra pelos poros
do corpo, da alma,
até ser em ti,
sem peso e memória,
um acorde só
do vento e da água,
uma vibração
sem sombra nem mágoa.
Eugénio de Andrade, Ostinato Rigore
imagem encontrada em : "flora", de Edward Lucie-Smith
Ilustração de Setembro, Ano II
Texto de Setembro, Ano II
CANTO DE OUTONO
Canto o meu amor por ti
quando no céu aparece
a estrela rara da manhã
e tudo o mais desaparece
Canto o meu amor por ti
tão quente ainda o sono
tanto mais de mim por ti
luz e inquieta no outono
Canto a manhã nos olhos
o sabor a fruta madura
canto o que o sol aquece
e insolente são perdura
Canto alegrias fugazes
no céu de nuvens da manhã
canto o que em mim desperta
o simples brilho da romã
José Ribeiro Marto / in http://margensdapoesia.blogspot.com/
foto: fernanda s.m.
( tratando-se de vídeos ou slides convém desligar primeiro a música do blogue na caixa « canto das estrelas » )